"No
mais profundo da crise por que passam as nossas sociedades,
diante
da imensidão dos problemas,
subsiste uma esperança."
Albert
Tévoédjè, 1977
............... As
Organizações da Sociedade Civil têm em seu histórico anos de
atuação fazendo aquilo que o poder público não consegue fazer:
estimular e apoiar a organização de pessoas excluídas dos círculos
sociais e capacitá-las para intervir de forma mais efetiva nos
processos de formulação e controle social de políticas públicas.
Ainda que existam em significativo número no Brasil, não é papel
das Organizações da Sociedade Civil (OSC’s) executar programas em
substituição da presença do Estado, mas sim, suscitar alternativas
para a melhoria da qualidade de vida da população, buscando superar
as desigualdades sociais. Levantamentos apontam significativa relação
entre o nível de desenvolvimento dos países, o número de
organizações sociais existentes neles e sua população. Isso
leva-nos a afirmar que, o número de organizações sociais
estabelecidas em um país é diretamente proporcional ao número
cidadãos interessados em participar da gestão de seu Estado.
.................Para
efeito deste ensaio, considera-se OSC’s entidades privadas, sem
fins lucrativos, que desenvolvam ações de interesse comunitário,
que não acumulem, tampouco, distribuam lucros entre seus associados;
atuem na promoção e garantia de direitos, podendo estas,
desenvolverem ações nas áreas da saúde, moradia, assistência
social, entre outras. Ainda que designadas sob uma mesma
nomenclatura, é possível encontrar variados tipos de entidades,
seja em razão de seu tamanho, missão, modelos de gestão ou
estratégias de sustentabilidade, completamente diferentes. Já,
Poder Público, considera-se os órgãos com autoridade para realizar
trabalhos em nome Estado Brasileiro. A este, associam-se os poderes
Legislativo, Executivo e Judiciário, estejam eles situados em
quaisquer dos níveis da federação- municípios, estados, Distrito
Federal e União. No tocante das premissas introdutórias, a
presente pesquisa buscou conferir destaque a política prospectiva do
referido Marco Regulatório, revelada através do Procedimento de
Manifestação de Interesse Social. Não menos importante, buscou
ainda discutir suas contribuições para a efetivação da
participação cidadã. Caracterizou-se como uma pesquisa
qualitativa, analítica, descritiva e comparativa, que teve como
fontes livros, artigos científicos e matérias de sites
informativos.
.............. O início das discussões sobre a necessidade de se
estabelecer, na forma da lei, mecanismos de contratualização entre
Poder Público e Organizações da Sociedade Civil datam da década
de 90. Foi a Associação Brasileira de Organizações Não
Governamentais- Abong quem provocou os primeiros debates entre os
anos de 1995 e 1996, tendo em vista, a formalização de um canal de
diálogo e negociação das organizações sociais com a União,
sobre a matéria. Com o advindo do segundo mandato do governo Lula,
outras organizações somaram-se ao debate pelo reconhecimento de sua
contribuição para o aprimoramento da democracia e desenvolvimento
do país. Nesse momento, o debate ganhou robustez e consistência. Em
resposta às articulações iniciadas em 2010, o governo da então
Presidenta, Dilma Rousseff, instituiu um Grupo de Trabalho- GT, o
qual fora composto por técnicos representantes do Governo Federal e
que contou com a participação de representantes de organizações
da sociedade civil; após a realização de 2 seminários (o primeiro
nacional e o segundo, internacional) e 2 consultas públicas, a lei
recebeu a sanção presidencial. Inscrita sob o número 13.019 de 31
de julho de 2014, a lei que instituiu o Marco Regulatório das
Organizações da Sociedade Civil (MROSC), vem estabelecer um novo
ordenamento jurídico às parcerias estabelecidas entre a
administração pública e organizações sociais, envolvendo ou não
transferências de recursos financeiros, bem como, prevê a criação
de conselhos gestores e plataformas para o acompanhamento
(transparência) das políticas pública. Respalda - pelo menos na
teoria, porque ainda não foram feitos estudos suficientes sobre a
matéria - as especificidades de suas partes por meio da instituição
de mecanismos de controle e transparência que as ajudarão a
alcançar os objetivos os quais se propuserem. Tendo como princípios
a promoção da segurança jurídica, valorização das organizações
sociais, transparência na aplicação dos recursos públicos e
efetividade na realização de parcerias, o MROSC inova, em meio a
outros dispositivos legais, ao criar instrumentos jurídicos
adequados à natureza das partes que o compõe. Não obstante, ainda
que reconheça a relevância deste aspecto da legislação, não cabe
neste ensaio a discussão das implicações concernentes à expressão
adequada,
no contexto em que se encontra.
................. A criação de um novo Marco
Regulatório é fruto de amplo debate frente ao processo de
criminalização da práticas e forma de gestão das OSC’s.
Burocracia e constantes mudanças nas regras que balizavam as
relações destas com o Poder Público, corroboraram a necessidade de
criação de instrumento específico, frente à instauração de um
Estado de insegurança jurídica para ambos os lados. Anteriormente,
as parcerias recebiam tratamento semelhante ao dado a entes públicos,
com a celebração de convênios, regidos pela Lei das Licitações e
atos complementares. Um exemplo dessa afirmação é o foco das
aferições (prestações de contas), antes meramente quantitativo, o
que assume novo caráter, ao utilizar como raiz de seus parâmetros o
controle dos resultados, conhecimentos e valores (neste caso, não
financeiros) transferidos pela organização aos beneficiários da
ação. Contudo, além das inovações destacadas, o MROSC traz a
possibilidade das organizações da sociedade civil, movimentos
sociais e cidadãos apresentarem ao Poder Público, temas de
interesse e relevância social através do Procedimento
de Manifestação de Interesse Social (PMIS).
Com isso, cidadãos poderão contribuir de forma mais significativa
para a construção de políticas públicas voltadas ao atendimento
dos interesses e necessidades da comunidade local. Contudo, fica
evidenciado o fato de que, dentre os diferentes mecanismos de
participação cidadã instituídos pelo referido dispositivo, este é
o que requer maior atenção quanto a sua adequada regulamentação,
tendo em vista, os fins a que se propõe.
.............. A sociedade
político-brasileira tem entre os princípios fundamentais de sua
Carta Magna a participação popular
na
gestão da coisa pública e a soberania de seu povo, como um direito
inerente à garantida da dignidade humana. Logo, o direito
constitucional de participação na construção dos rumos do país
está, intimamente ligado à concepção de cidadania, que por sua
vez, reconhece o indivíduo como pessoa integrada à sociedade, com
direitos e deveres, sedento por usufruir dignamente dos bens e
serviços socialmente produzidos. Todavia, cidadania não é algo que
se ganha pronto, mas uma condição conquistada progressivamente.
Efetivar a participação cidadã pressupõe a existência de condições inerentes à vontade dos sujeitos, sendo estas não apenas condições
constitucionais- conselhos, plebiscitos, referendos, iniciativas
populares, etc., mas também ideias. Estas, penetrando nos círculos
sociais, determinam o progresso humano ao transformarem a sociedade
na qual se estabeleceram. No entanto, quaisquer transformações
significativas, precedem a construção (in
loco)
de processos coletivos, materializados entre as diversas formas e
finalidades de planejar. A esse processo é dado o nome de política
prospectiva, isto é, um planejamento estratégico, embebido de
interações interpessoais e sociais, longe das salas fechadas dos
Governos, fundada essencialmente na participação do povo. Com isso,
deixa-se de navegar às escuras e aproxima-se cada vez mais da
realidade do povo.
.............. A responsabilidade por fermentar na sociedade o
interesse pela participação cidadã é coletiva – poder público
e sociedade civil. Nesse sentido, o MROSC ratifica as ações de
educação para o exercício da cidadania via pactuação de
políticas públicas e não mais como ação pontual. É no PMIS que a política prospectiva se
consolida, ao institucionalizar o protagonismo dos empobrecidos, na
busca por sua libertação. Logo, já é passado o tempo de o Estado
assimilar essa máxima, tomando-a como verdade, no curso da
desconstrução de sua autoimagem redentora. Por fim, reafirmamos a
evidente e necessária existência de organizações sociais, em
razão de sua contribuição para o exercício da democracia a pleno
título e afinco na luta contra a criminalização dos movimentos (e
direitos) sociais, garantidos constitucionalmente a todo o povo
brasileiro. Desta forma, a criação do Procedimento
de Manifestação de Interesse Social, no
âmbito do novo Marco Regulatório das relações de parceria entre
Organizações Sociais e Poder público, constitui-se em uma
ferramenta que impulsiona a participação da sociedade civil na
definição e controle social das políticas de interesse público.
Palavras-chave:
organizações sociais; marco regulatório; participação cidadã.
Publicado em: ANAIS DA 13ª MOSTRA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA, 2016.